Antonio Gil Neto “Sou hoje o ponto de reunião de uma pequena humanidade só minha”. (F. Pessoa) .
A
descoberta do fogo, a invenção da roda. E o amor se desvelando
infinitamente. Atos e palavras. A humanidade se reinventa. E nós,
sobreviventes da geração que emerge das anteriores. Dízima periódica.
Até que o mundo não agüente, se mostre sem surpresas em novo dilúvio ou
fazendo valer alguma profecia, tudo se move, se atualiza. Presentes e
futuros envelhecem à espera de outros tempos novinhos em folha. Eco da canção mineira: os sonhos não envelhecem.
Amor, sentimento primoroso da identidade humana desfia-se e nos desafia
na busca da melhor forma de viver. Os problemas sobrevivem na pauta dos
dias mais comuns. Mudam de cara, de layout, desfilam na fieira de gerações.
E o escrever, linha d’água da vida, moto contínuo. Oportuno: quantas
ocasiões fazem o escritor?Quantas aldeias adormecidas a despertar... Importante
diálogo: o real e a escrita. Suscitam olhares. Ilustram imaginações e
se desdobram em reescritas. A inspiração inaugura-se no reflexivo, no
burilar, na escolha do tom. Poemas não florescerão da ponta dos dedos. A
exposição: o mural de palavras que guarda imagens. Algo a investir,
surpreender! Se a imagem vale por mil palavras, um olhar apurado vale
por um infinito. Com a palavra o olhar vira busca e resgate. Capta as
emoções primordiais. O movimento se descongela e se corporifica. Tela,
papel a arte realizada. Vale uma crônica? Um poema? Entre linguagens,
sem predomínios ou muros, a vistoria do olhar-palavra intensifica o jogo
do criar. Uma imagem aponta. Instiga, alimenta, sugere, amplia,
convida, propõe, projeta. A crônica evidencia o olhar. O poema acorda em
corte de pedras. Há após leituras e escolhas. Mas há o projeto: o
texto. Outro suscitar provocativo. Fios de meada pedagógica, acredito.
Esse solitário ofício da escrita. Mostrar costuras, avessos, transparências de tirar o fôlego. Cavernas. Para ser solidário.
Um filme perturbador nos causa incômodos dos mais diversos. No abrir
os olhos as palavras que guardam repensar. Talvez dados alarmantes. Ou a
borda da história que nos retrata. Atentos para o perigo de generalizar
ou achar.( As ONGs são poços de más intenções?) Das
provocações à imprescindível reflexão. Cenários se desvelam nas
palavras: generosidade ou exploração se formatam para o jogo leitor.
Uma proposta ácida, provocadora pode nos atrair. Saímos do pés atrás
para ficar diante do estarrecido que aflora. Nosso olhar disponível a
descobrir. A desvelar atitudes, valores ou descaminhos. Aqui é que
entra mais um fio do nosso fazer, outra proposta.
Do lado educador aposto em lugares menores, nada alardeantes,
estridentes: o imprescindível para que o livro caia em algum redemoinho
humano e aconteça de vez. Que aconteça silenciosamente a partir de
pequenos pontos disparadores que alarguem sonhos e contemplem desejos.
Que as palavras das páginas virem vitrines, cortinas que se abrem para
despertar os desvios dos mais curiosos. Outro fio: estratégias das
tantas brincadeiras íntimas com as palavras. O lugar do livro é na casa
de cada um: no seu cotidiano, chuva e sol. Isto e aquilo. No lugar
onde a gente é. No quartinho, na rede, na tenda. No tempo e espaço
disponíveis. Sempre. Moram com a gente, como pessoas queridas. Alimento e
beleza. Disponíveis ao nosso desejo particular. Não fala por si. É
apenas possibilidade generosa. Por ele um enveredar pela fantasia aos
sabores de uma voz convidativa e inebriante. Que o livro seja amoroso
objeto que nos acompanhe na vida. Que a reinvente, que a revigore.
Mas, lugar de livro morar com necessária certeza é na escola. Objeto
de primeira necessidade, consumível, perecível. Após sinfonia de
dedos vorazes. pelo saracotear das travessuras leitoras fica sujeito a
se autodestruir. Nela o impulsionar de movimentos leitores: caixote,
carriola ou carrinho de supermercado. Que circule, povoe mãos, desperte
olhares. Ei-los, os livros, numa cesta sob as árvores dispostos aos
desejos pequenos ou armazenados em lombo de burro, caixeiro-viajante, a
circular pela comunidade escolar à cata de novos leitores, ampliando e
criando novos espaços de respiro. Ah, esses inconfundíveis
companheiros.! Sobretudo nas salas de aula, lugar nobre e principal! Ali
que mora a potencial mediação. Ali vivem os atores das leituras,
cúmplices de um projeto tramado em palavras de se aprimorar a cada dia.
E o palco e a ação. Sugeridos, experimentados, escolhidos, acolhidos,
partilhados pelo gosto de espera e dos olhares a despertar. A
experenciar. Sopros de vida. Com liberdade e alegrias. Sem alardes.
Há muito para falar? Suponho que alguém que nem tenha ido a alguma
Bienal do Livro possa nos dizer sobre esse lugar e sobre o papel de cada
um de nós na vida dos livros. Neles, o plural do Universo. E o
particular e genuíno.Estações de tantas luzes. Eterna exposição. Quando
nele nos adentramos temos o coração num pulsar de solenes expectativas. O
farol de muitos e outros detalhes a saber, a descobrir. Nas breves
despedidas saímos aturdidos, felizes, plenamente acolhidos pela poesia
que guarda todos e cada um de nós.
Simples e rasteiro, somos sustentados pelos nossos sonhos. Talvez
pela ínfima possibilidade em realizá-los. E assim continuar alimentando a
máquina humana de sonhar e viver.
Em delicada beleza as palavras se instalam. Em melancolias ou
alegrias. Mariposas etéreas se debatem na busca de luz, esse tecido
magnífico. A poesia das palavras alinhadas gera sons. Provocam ondas a
circular pela eternidade mesmo depois de não mais serem ouvidas. A
poesia e a eterna ligação com o mundo. Nos leva de volta, nos permanece.
E nos leva além. Em aprofundamentos, como as mais divinas forças.O fio
do corte.
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Começo
esse texto sobre filmes e livros com a questão-título quase óbvia,
motivadora às vezes de algumas das nossas conversas. Geralmente
consideramos o livro melhor que o filme. Por várias razões: sua ideia
original, podemos ser donos do próprio conduzir em nosso particular
tempo de leituras, percebemos as sutilezas e os detalhes, usamos de
sobra a imaginação, temos dose ampla de criar e sentir uma aura de
co-autoria. E por aí vai. Vou direto ao assunto, sem fugir da
intenção. Vi o filme e li o livro. Fiquei por um tempo na dúvida sobre
qual seria melhor: o original, a motivação, a inspiração ou o seu
produto recriado em 3D, com direito a sentir o sonho mais de perto e em
movimento, quase real. Decidi agorinha e me lanço à apreciação de vocês.
Livro ou filme. Ou, filme e livro. Tanto faz. O importante é - em
palavras ou no mover da sétima arte - nos adentrarmos ao mundo dos
sonhos a que temos pleno direito. A história que se corporifica
em ambos é a de Hugo Cabret, menino órfão que vive escondido na central
de trem de Paris dos anos 1930. Esgueira - se por passagens secretas,
faz pequenos roubos para sobreviver e para consertar seu enigmático
autômato. Sem ser percebido, cuida dos gigantescos relógios da estação:
escuta seus compassos, observa os enormes ponteiros que dançam
meticulosamente, responsabiliza-se pelo funcionamento deles. A sua
sobrevivência depende do anonimato. Tenta se manter invisível. Guarda um
segredo que é posto em risco quando o severo dono da loja de brinquedos
da estação e sua afilhada Isabelle cruzam o seu caminho. Ainda posso
dizer de incentivo imaginoso que um desenho enigmático, um caderno
valioso, uma chave roubada e uma figura mecânica - herança do pai de
Hugo - estão no centro da imprevisível história. O livro
inspirador é “A Invenção de Hugo Cabret”, de Brian Selznick, publicado
pelas Edições SM. Ao folheá-lo já podemos nos imaginar sentado no escuro
à espera do início do filme. O livro com mais de 500 páginas, traz
muitas ilustrações do autor – muito próximas de um storyboard – além de reproduções fotográficas históricas. Já
em “A Invenção de Hugo Cabret,” filme de Martin Scorsese baseado no
livro, é claro, a trama se dinamiza quando Hugo se encontra com
Isabelle. Os dois jovens passam a investigar um mistério sobre o passado
que cruzam suas vidas. Aos poucos personagens e tramas gravitam aos
nossos olhos e imaginação para nos contar sobre a arte do cinema. Mais
que isso: a influência de Georges Méliès sobre ela. O longa nos
leva a uma sutil aventura do passado cinematográfico, desde a invenção
do cinematógrafo pelos Irmãos Lumière em 1895 - que achavam que sua
traquinagem teria um interesse técnico passageiro como forma de
divulgação da sua fábrica de fotografia - até os longas mais complexos
para aquela época. O filme nos diz brilhantemente que foi
preciso outro francês, Georges Méliès, para dar sentido artístico à
descoberta dos Lumière. Méliès vislumbrou o bom futuro daquela invenção.
Com sua câmera e estúdio construído no fundo de um jardim realizou seus
primeiros filmes. Todo seu talento de ilusionista se encaixa na nova
técnica. Cenários de papelão e tecido, luz do dia, trajes e cenários
mirabolantes, além de colorir as imagens em preto e branco foram
especialidades do então mágico Georges. Suas trucagens cinematográficas
bebem da literatura: Julio Verne, Grimm, Perrault. Assim é Méliès o
primeiro cineasta da história. Produziu e dirigiu cerca de 500 filmes,
de 1896 a 1912. Ele descobriu que o cinema poderia recriar sonhos e
mostrá-los ao espectador. Este é aspecto fundamental da trama. Penso
que o cinema é arte de manipular, enganar, iludir. Bom demais. Ele nos
envolve em uma história ou situação que num determinado tempo nos é
palpável, real, por mais absurda que possa ser. É mesmo poderosa a
sétima arte em materializer sonhos, através da manipulação de imagens em
movimentos mágicos e ilusionistas. Integram-se à ficção e em
plena harmonia referências a filmes antigos. Testemunhamos em meio ao 3D
“A Chegada do Trem à Estação”, um dos primeiros filmes feitos pelos
irmãos Lumière que causou pleno frisson na belle époque parisiense. E
mais: várias citações de filmes mudos: “Luzes da Cidade”, de Chaplin, a
clássica cena de Harold Lloyd pendurado no relógio em Safety Last! e
“Viagem à Lua”, o conhecido filme de Méliès. Quem diria que 116 anos
depois da primeira exibição de um trem vindo em direção à plateia, agora
inserida numa produção em 3D ainda seria capaz de causar comoção pela
ilusão momentânea da imagem em movimento? Sem querer ser crítico
de cinema sinto no meu lado espectador a brilhante direção de Scorsese. A
meu ver ele tece um resgate da figura de Méliès, com toques de um
filme pensado para o público infanto-juvenil. Tudo se desamarra de uma
seriedade para brincar de fazer arte e cinema. É uma celebração. Temos
um Scorsese diferente, outra cor e sabor e que se deixa levar pelo 3D
como brinquedo novo. Este filme é indicado para cinéfilos e curiosos de
todas as idades. É uma verdadeira aula de cinema! Concordo com os
que dizem que em a “A Invenção de Hugo Cabret” temos talvez a melhor
utilização de 3D até agora. Prepare-se para deliciosa viagem! Scorsese
filmou com câmeras 3D ao invés de simplesmente converter o longa. Usou
sabiamente a tecnologia de sobreposição de camadas, proporcionando uma
experiência de imersão fantástica. No escurinho do cinema, bem à frente
dos famigerados óculos escuros, dançam e pulsam lindamente em nós
elementos etéreos: fumaça, vapor, neve ou simplesmente poeira da loja de
brinquedos. E por entre as sutilezas de contar a história de Hugo conta
a história do cinema. Somos conduzidos pelos olhos de um menino.
Realidade e fantasia se mesclam. Somos espectador em sonhos. Livro e filme realizam testemunho eterno de amor pelo cinema. Uma das frases de Méliès no filme é " Venham e sonhem comigo".
Acho que podemos obedecer em ambos os casos. Teremos belos momentos em
nossas vidas. Sobretudo os que amam o livro e o cinema e toda a sua
arte.
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Antonio Gil Neto“Um galo sozinho não tece uma manhã: / ele precisará sempre de outros galos.(...) “Aquele rio / é espesso / como o real mais espesso.(...)”(João Cabral de Melo Neto)
Na tela João Cabral um tanto quanto jovem, risonho. Atrás, como
se acabado de escrever na parede, letras de brilho de faca e sanguínea
frase que dá títulos, vislumbres. Rabiscos de poeta em possível. Um
poema por dia. Tecendo manhãs.
E assim se faz visitas. Virtualmente? Quem sabe de bom grado e de
coração confesso. Presente no imaginado, toque de perto em olhar. Esse
nosso estrangeiro olhar...E um cheiro do fantasioso: objetos, cenários
de singela vida. Tantos Severinos poetas! Por hora adentrar-se em
memórias. Outros rios e versos. E lembranças de pedras que nos enobrece
de raiz e céu. Lida de chegar, viveza em desvendar palavras é que
se começa e se tece na Educação. Os mistérios do fundo do mar em
paralelo ao poço de cheirar cola. Entram de imaginação. Mas meninos, se
configuram na consistência poética. Fico apostando, uma vez de muitas,
em pausa avaliativa, em leitura da mais importante na feitura do humano.
Tecido em memória e fantasia, esta lente. E o analisar o tempo. E o que
decorre. O que vive tantos meninos? Famílias, escolas, ruas... Poderão
ser modificados por encontros transformadores. Que se possa recontar
suas vidas como quem conta sobre vidas cidadãs. Sem esconderijos.
Agorinha este refrão mineiro: “os sonhos não envelhecem... ”. Talvez
este texto pudesse dar tantas crônicas! Mas vou deixando-as no revés. E
o que me leva aqui e agora é o espaço educador. É tempo de oficinas? O
Futuro é gênero que se reinaugura. Crônica ou não, nossos afazeres
pedagógicos andarão a acontecer que sei. Desenham em silencioso
trabalho, em sonho e em melhorar esperanças. Aviões cruzam o céu,
quase livres. Feito pássaros emergindo de florestas perdidas. Depois
outros mais. E tudo segue nos cronômetros fatais e regularizados. Fico
mais a olhar as nuvens embelezando o azul, em eternamente. Poderá esse
eterno de nuvens ser prisão? Embalado em filosófico já olharei todas as
caras, os transeuntes e os que estão na minha aldeia. Na minha faina.
Sigo as linhas. Imerso em céu de íntimas possibilidades. E o por fazer.
Por eles e por todos. Nós, humanos possíveis, com direito a viver sob
as nuvens. E em estações de pequenos sonhos. Sempre viro e volto
para o preciso pensar o depois. Mais as dificuldades a imaginar e a
haver. Sinto o tecido de mais possibilidades em meus quereres. Vejo de
longe números em meio aos emaranhados. Um cheiro acinzenta o redor. Há
mapas de cicatrizes indicando percursos. E a volta? Mas aviões continuam
suas procissões no azul. As nuvens, eternamente livres. Os meninos,
bagagens. Quem sabe não se veja no desenho plúmbeo um vislumbre de
alguma cor. Você tem e quer? (Guardar uma ideia em página de almanaque como quem guarda flores. E um norte em vermelho. Ah, e um trecho de uma canção!) No
lado da prateada liberdade imenso muro alto. Alto sim, com mil aparatos
técnicos de segurança. Ali uma árvore se empina livre, entregue à
correnteza do verdor cósmico em estações. Gerara flores para a vida
correndo solta. Um vento brando derrubara algumas já vingadas. À curta
distância um leito de flores brancas amaina o chão. Generosa
cumplicidade. Em algum canto da cidade alguém leria alguma notícia e em
outro, um pavonear de adereços, gesto curto e certeiro. Mas, haveriam
olhos no reinventado. Cúmplices em fantasias. Sede e fome impulsionando
outros movimentos e corpos. Em desenho e dança. Para as próximas os
provisórios olhos sagazes. Peixes de luz, se inebriarão dos pequeno
delitos amorosos. Ou se traquinarão na mais marota das experiências. Fecho
a porta, duas voltas. E a janela plena para o ar leve da manhã em
sintonia com o que sinto ser importante. Dizer deste tema. Lançar ideias
que aludem o fazer nas escolas. Não me arrisco a novidades. Às vezes as
obviedades e o aparente têm sua importância a olhos navegantes. Peso
um tempo de averiguar tessituras. Ação e esperas. A construção. Nova
folha desponta frágil e tenra em campo de árvores altas e fecundas. E em
poesia. Sujeitas à intempéries, riscos, agudezas. Mas sabem da
quentura, da chuva e do alimento em raiz. Vão reescrevendo-se na
composição de ocupar lugar ao sol. Sem luta de forças, queda de braços
ou o que separa fracos de fortes. É a arena das possibilidades em
palavras. Agulhas em trabalhos que vingam. Fachos, pequenas luzes,
gravitando-se. E o luzeiro na imensa escuridão. Um cheiro de café
se espaça pelo ar. Uma nesga de sol desenha no chão da sala o brilho
desse dia. A fumacinha da xícara sobe num compasso indolente e as flores
alegres no vaso são apenas moldura para a música tomando conta de um
breve viver matutino que se foi e se prende nas palavras. E no eterno
verde. O piano de Tom e a voz única de Elis tomam conta de tudo. Paro
por aqui. Mas, quero lhe dizer em ligeira esperança palavras que lhe
instiguem. Vislumbro sua próxima festa e algum surpresar na sua visita à
poesia. E agora só boas portas e janelas abertas. Vamos brindar pelo
novo dia.
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Antonio Gil Neto
"Tanto
tempo, juntos!/ Tanto... / Tantos dias nesse vagão./ O trem da vida
passando / Horas, dias, vidas, / Sentimentos, /Vivemos em cada estação.”
Transformar a
dor e a saudade, que toma raízes, em guardador de memórias. Deixar que
circule o leve brilho do que se foi, de quem se vai, este incógnito.
Entendam, compreendam e sintam. Abram espaço para reconhecer rasgos de
presença.
Temos às mãos o mais sublime e sagrado criado: as palavras. Assim se pode homenagear o
que fica em sonhos. Escolher palavras nascidas de pulsar presente.
Assim, os céus das memórias. Toldo azul e branco. E as estrelas de
eterno luzir.
No meio das vozes, dos anunciados, a ponderação. E o recente. Mais o impossível.
Leio de
interessantíssimas razões. As matérias e os enredos. Interlúdios.
Teoremas. Aguço-me por tantas pistas de descobrir. Brilham. Nuda Veritas.
Reverberam. Revisito suas palavras em mãos, ouvidos e plena disposição.
E com olhar do mais curioso. Alvoroçado com o tecido das sua cores e
tons, abstraio-me. As mensagens circulam. Disparam viagens.
Sempre uma história recolhida. E tantas a revelar. Há paixão pelo ler e escrever?
Fisgado por inquieta aparição e instigado ao encantamento vou me
reinventando que só. Sabedor das histórias tão bonitas renasço
abruptamente. Motes e fantasia. Um cenário dessa paixão em palavras de
Drummond: “E eu não sabia que minha história/era mais bonita que a de Robinson Crusoé”. Muitos mais haveria. Quem sabe num outro dia, noutro livresco passeio.
Mergulhar para
aqui recontar, reencontrar. E revelar o imprescindível por nos
tornarmos letrados. Nos encantarmos pelo pitoresco daquilo que brilha e
pulsa na palavra que nos agrega em humano. Quem sabe não se possa
recontar episódios renascidos! Um jogo generoso de
descobertas...Mergulhar. Fundo. De viés e de peito em chamas. No tempo,
na memória da imaginação. Nas palavras, este imprescindível. Feito faca, feito flecha, feito fogo.
E assim foi e
assim é. Queremos continuar nos lispectorizando, nos pradiando, nos
drummondiando, nos quintaniando, nos pessoando, nos
machadiando...Virando gente em letras. Sermos pluralmente únicos. Em
pulsar no que nos faz ser. Cúmplices das próprias artimanhas. Das armadilhas destes lindos labirintos.
Lugar sagrado como este: morar breve no miolo de um livro. Ou ser luz de desejos em telas virtuais.
Nossa alma se
revela em letras, entoam olhares de corações leitores. Nos aventuramos e
isto nos leva a aventurar-se montão. Aos poucos. Toque sutil de
espreitas e prosseguimentos. Mas, sempre à espreita, a primeira vez. Dentre
mil belezas um céu a ser devorado aos poucos. Manso quase e de
soslaios. Um não saber em véus. Poderíamos contar o que me ouve em
silêncio em clarão de sabedorias? Incendiarmo-nos em todas as veredas,
desertos, montanhas e esboços. E nas salas de aula por onde passar a
incondicional paixão pela palavra escrita.
Do lado de cá suscito algumas alegrias de leitor. Fecho e abertura, trecho de poema, canção. E ensejo cada palavra subir ao coreto e se inaugurar. Alvissareiro, em primeira mão continuarei aqui. E o que inaugurado: livre, poético, pedagógico? O que nasce em palavras pode ser entregue. E brotará em novo.
Movimento profissional, experiência iluminada, um modo, uma cor, um algo mais, um sem fim que nos remeterá a uma janela? Nossas palavras, com que dialogamos. O
que nos diferencia e nos une. Lanço-me nesse fazer de encantamentos.
Pequenas bonitezas para viver a vida e para sustentar nossa profissão,
já que há o possível. E esta esperança. Faremos isso como quem abraça o
mais forte. De sonhos comuns. E os que podem com a garra e o feitio. E
depois, o puro sentimento. Só imaginar e imaginar. Que imaginação
sozinha não daria conta de episódio singular ou importante. Precisa ser
apontada, como coletar encontros, conversar miudinho com toda gente que
se põe leitor, esta peripécia que ainda resplandece.
Penso é no educar da leitura com a escrita em íntima trama. Em qualquer destino. Temos por este legado o perene que semeia e lança o futuro a despontar.
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Antonio Gil Neto
“ (...) O amor que não esqueço é
justamente o que não sei os motivos de seu fim./O amor que permanece é
aquele que não sei como começou”. (Carpinejar)
“Tudo havia começado com pungente ideia. Diante da mesa, do trabalho, da janela pleno repertório de escolhas”.
Sempre polêmica a imagem do educador desses nossos tempos. Em nosso
percurso uma arena encimada e circundada por ela. Uma profusão de
palavras em colagem de almanaque à disposição de boas estratégias
educadoras. É possível ler Machado a qualquer hora, em qualquer lugar,
para qualquer um, com atenção, emoção e prazer? Imagine só as vibrações
leitoras! Delyrio?
Matrizes para um movimento: a origem de uma cronologia sumária
incrustada nas paredes, penduradas no teto, mesas e cadeiras feito
pesquisa e exposição. Explodirá aos olhos educantes, visitantes em
danças pela alma do perfeito escritor. Desata-se assim um tanto de
enigmas. Esses visitantes, de olhos simples de quase leitor, podem pegar
um livro, sentar-se numa poltrona e manuseá-lo. Livres. Sentir- lhe os
odores, marcas de tempos. À vontade, ele se mostra ao sol. Vale
brincadeira, passeio provocativo e imaginativo em boas intenções. Do que
continuarão as palavras que lhes permitiram resgatar alguma celebração?
Por elas um caminhar em jeitos de aventurar-se...
E aquela façanha da falta de assunto? Cadê o tema para escrever? O
desencontro a que estamos sujeitos a viver. Imerso em pensamentos se
recupera de baque inicial. Uma palavra, quase gesto, pode mudar tudo.
Bem posta, de incrustação firme se instala no lugar da alegria a
relampejar.
“Viajo, viajarei em esperanças. Recupero desejo perdido, menino
curioso frente ao quase desconhecido brinquedo. Em breve felicidade
clandestina investigo o que estava guardado dentro do abrupto”.
Em capa quase vermelha, o texto, a planta. Alvo e finalidade. Um
jeito de reencontrar o sempre perdido pode ser saltear as páginas com um
chá de gengibre. À mercê de algum tema algum desses movimentos morarão
em casa. O tempo passa em sinfonia regular. A orquestra ecoa na vida e o
baile muda. Meninos viram homens, arrumam suas vidas como podem.
Personagens de tempo. O agora vai mudando de novo e retoma. Mais rápido
que uma lembrança ou um pé-de-vento provisório. O que era claro está
tranquilo, límpido, outonal? Tramas. Novos dias. O hoje desse futuro
interminável acontecerá como benção. E haverá memória de sentimento
vívido. Desenhos de cor.
Os que passam permanecerão. Extasiados, revigorados em atmosfera de
velho jardim amanhecendo plenamente. Que exala incomum, inebria daqueles
olhares. E havia tantas flores! Do rosa ao carmim! Um momento de
paraíso naquele lugar daria outros.
Ah, as palavras. Cada vez que elas surgem surgirão festejos de
imaginar. Um detalhe aqui, uma surpresa: acolá. Para recriar a
existência e acalantar o nosso bel-prazer. Infringindo miras e o
eficiente de sentido. Ótica de transgredir assim. Para isso , jeito de
pés desnudos, aventureiros de caminhadas, mesmo experimentadas. Por eles
desbravamos chãos. Ora espinho, caco de vidro, um escorpião que crava
sem piedade esses destemidos aparatos de busca. Pés, metáfora de buscar.
Ferem e sangram. Há pedrinhas, deslizes. Saltitamos. Nossos pés
bailarinos fogem da dor. Querem água fresquinha acarinhando. Imenso
frescor. Sob tenda de céu curioso minúsculos lambaris borboletearão por
entre esses temerários andarilhos e darão sinal de prosseguir. Rumos. O
certo está por vir.
E há sempre um viés de memória dos mais. Sem rever o que é em preto e
em branco. Projeta-se em espontâneos coloridos. De sabor se
aquarelando. De lembranças guardando o invisível. Assim o reviver em
palavras.
Esses são segredos e lições dentro das coisas. Narrador e leitor de
pés trilhados. De mãos dadas com seu percurso. Páginas viventes.
Toca fundo o sentimento dos que lidam com Educação. Singelo, deixam
marcas de vida e de história indeléveis. Somos textos, estados
permanentes em criação. Somos reescrita e aprimoramento. Por isso o
aperfeiçoar e esses novos rumos. Guardamos o que vivemos. Somos uma
biblioteca que sangra. Plenamente possível e inesperada. Nossos desejos
íntimos dialogam com limites, vigoram memórias já sabidas de intensas
atribulações. O aprendido mais o nebuloso, combinatória indescritível a
nosso favor: um encantamento e quem sabe o leve desabrochar de sonho.
“O que guardam estes exercícios? Outras tarefas do quase indecifrável. A decifrar”.
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UMA INTRODUÇÃO MERECIDA
De repente, o Tempo. Me dei conta de que havia escrito mais de 100
textos. Não seria motivo para comemorar? Seria sim. Uma roseira que
floresce plena? Algo do tipo de milésimo gol de Pelé? Um alfabeto que
procria? Soube claro de alegria. De importância íntima e valorosa. Isso
sei.
O que fiz? Dos textos postados mais:
mil ideias... Inspirei-me em mim mesmo. Melhor: em nossos diálogos
miúdos e pungentes, tão potentes em pedagogia e poesia. Desde 2007
bordando as primeiras palavras nesse gigantescamente virtual... Fui
rememorando os textos, eles que são os encontros. Deles uma ideia, uma
frase, um fragmento. O memorial. De novo arranjo, fui tecendo textos de
novo feitio. Por trás, nossa história na Comunidade Virtual.
Com intento de agradecimento, brinco em cândido patrimônio: nossas palavras. Brindo a elas com vocês. E aos nossos futuros encantamentos.
Como aventureiro de boas paragens revisito palavras semeadas na tela
da nossa Comunidade. Fui relendo, me repaginando. Novas surpresas. As
lembranças. Passagens, trechos, brechas... Por elas me reencontrei.
Reencantado em fogos comemorativos fui abraçando algumas delas.
Respirei-as em hálito inventivo. E as trouxe para este presente.
Virariam textos renovados. Linha dágua de tantos olhares leitores.
Resultados: alguns textos renascidos dos mais de cem já postados. No
milagre das palavras que bailam entrego uma temporada comemorativa:
estes INÉDITOS INEXATOS.
( Voltei o filme, lembrei-me dos primórdios. Lelê, Helô, Roselene:
encorajadoras valentes. Agora, do “pessoal todo”: Regina, Bianca,
Jéssica, Nat, Luiz, que tecem amorosamente este nosso convívio com
palavras de bem comum).
Boas leituras!
Revivam os cem textos em mais. Com um jeito de permanecer agradecido
por haver a presença de cada um de vocês. Passam, namoram de leitor e
deixam a indelével marca educadora.
Gil.
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1. UM MENINO QUE ESCREVERIA MAIS DE CEM TEXTOS.
Antonio Gil Neto
“Eu vivo sob um
poder/que às vezes está no sonho,/ no som de certas palavras agrupadas,/
em coisas que dentro de mim / refulgem como ouro:” (Adélia Prado)
(Teria encontro de encantamentos. E escreveu mais de 100 deles.
Num toldo de realidades e fantasias os textos se teciam em cenário
iluminado por palavras. E haveria 101, 1001 tramas. Esse infinito a
escrever...)
Menino de interior não haveria de nascer para inaugurar letras em
papel. As palavras foram se achegando, aconchegando-se vento bom,
promessa de alegria pródiga. Aos poucos farturou-se de vida que
multiplicaria pontes. Em milagre de engenho: as palavras. Semeariam
mundos novos. Possíveis de esperança. De ofício.
“Às vezes me ponho a lembrar, a sonhar acordado no metrô, nas
viagens de ônibus, nos intermezzos das leituras, no olhar à toa pela
janela em tardes com chuva querendo vir...”
O Tempo, os tempos. Com seus preciosos parênteses no infinito
surpreende em encontros. Revigora minúcias do passado, não se sabe de
mais íntimo. Aderentes e ardentes, as verdades intactas. As memórias, de
escondido tesouro.
Poderia ser tradutor das brechas onde brilham fantasias. Tramas para
saber. Poderia ser indicador de sonhos e descobertas. Pontos de luz,
arco-íris e pão. Um encorajador, um silêncio do futuro que se faz a cada
pedaço e alento. A cada gesto e olhar. Poderia ser um amante das
esperanças, de amanhãs, dos desejos mais sutis. Mas, camaleão moderno,
se esquiva e se inteira em gramáticas do criar.
“Uma espécie de atordoamento me faz repensar estas coisas que
aqui digo, aberto ao tempo e ao espaço. Vou buscando as lentes para me
aliviar.”
Descobriu maneira simples e pessoal: decifrar, experimentar as
múltiplas de palavras. Esses objetos brincantes que brilham
possibilidades. E agora, as suas palavras: quais reluzem no agora? Quais
lhe dão lampejos? Que outras se quer para este tempo, léguas de
distante quase esquecido?
Eis as palavras, vivas de arfar. As inesperadas, as que estão à
espreita, as que saltam da memória para enfeitar. E esse falar de
infâncias? Conte, nem que for um pedacinho! Gostou? Você agora é seu
personagem de convívio com as raízes. Quais palavras lhe veste em
bordados do tempo? Que fascínios guarda em pedras coloridas?
Sempre sobra um acalanto para o inesperado. O inesperado é da bagagem
do educador que somos. Nestas trilhas, nosso coração é inquieto de
saber mais.
Desenha deslumbramentos, diz do fazer, da lida com palavras. E
gentes. E o desfiar em poesias, novas manhãs, cantares. Abrir as
janelas, arquitetar alicerces para sonhos. Mais o mistério do que é
homem. A vislumbrar, a criar. Existências se escrevem, as próprias
vidas. E, pois, a palavra escrita. Projetada. Para fora de grito lépido
silencia: íntimo pensar que se corporifica em outros. Redigir:
desfigurar palavras? Para isso as páginas, os capítulos, as telas
iluminando-se a toques múltiplos. Poder de encantamentos entre.
“Por conta de ingênua curiosidade, inventei histórias
que nasciam não das letras indecifráveis, mas dos desenhos que as
enfeitavam. Agora trago as palavras, histórias vivas da memória de cada um que há.”
O exercício da curiosidade: nítido aprender. E a extrema
importância: abrir o livro, a decifrar. Fazê-lo existir. Eis a explosão
que cumpre em destino. Na leitura, a fagulha do existir. Os diálogos
pairam no ar, sem mistérios, nuvens convidativas. E o inefável pousa em
campo de delicadas cores. As descobertas: breve milagre.
Os textos se alinhavam em generosidades. Num lugar imaginado e
inimaginável o Inesperado por se deslumbrar. Essas palavras forjadas
iluminarão rincões de mar e sol. Paragens. E tantas rosas-dos-ventos.
Vereda dos que amam a língua portuguesa.
Uma perguntas ribomba: que lugar é esse onde escolhemos permanecer?
Ponto de espera, nascente, minas e olhos d’água fecundando a travessia
de fios aos ventos? Afetos que geram trapézios com rede que acolhem
abraços almejados e tramados às margens da alegria? Ficam rastros e a
pele do futuro. Um veio amoroso, à espreita das correntezas e das
querências, modificando a imensidão do campo de sonhos. À terceira
margem estarão alertas, pulsantes. Eis palavras por encantar.
No inventário sobre a mesa, na tela, o vasculhar da espera e do
inesperado. Um sol de inverno convidando para algo mais. Abrir frestas
ao novo, acolher começos e louvar mudanças. Aventurar-se em trabalho
poético. Aventurar esse espaço, o virtual que carrega as artimanhas do
mundo: as páginas dos livros. Perambular. Viajar por algo novo escondido
em minha bagagem. Sustentador, levar poemas e estabelecer pontes ao
fazer de poesia. Plenamente conectados: trabalho e credo, se entrasse em
cidade de poemas. Um espanto bom. Um livre e inteiro dispor.
“Por quantas luas fico em tempo de brincadeira feliz? Pensei
alto. Educador que se preze, acredita. Tu és como o tom que musica.
Perceberão o verbo musicar? Imagine o que pode gerar isto naquele
começo...”
Lá fora o céu se avermelha. E tudo recomeça. Jogo destinado a
espectadores viventes, anônimos que perdem em barcos, em viagem.
Orgulhosos atores de singelas representações. O que foi narrado em Javé
guardo agorinha: “Uma coisa é coisa acontecida. Outra é coisa escrita. O escrito melhora o acontecido.” Biá nos fala das palavras do escritor amalgamando a realidade em ficção.
Nas entrelinhas, significância e beleza. Mais ainda. Tentamos salvar o que somos frente ao que nos é valoroso.
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