sexta-feira, 20 de abril de 2012


Antonio Gil Neto

“Sou hoje o ponto de reunião de uma pequena humanidade só minha”. (F. Pessoa).
A descoberta do fogo, a invenção da roda. E o amor se desvelando infinitamente. Atos e palavras. A humanidade se reinventa. E nós, sobreviventes da geração que emerge das anteriores. Dízima periódica.  Até que o mundo não agüente, se mostre sem surpresas em novo dilúvio ou fazendo valer alguma profecia, tudo se move, se atualiza.  Presentes e futuros envelhecem à espera de outros tempos novinhos em folha.


Eco da canção mineira: os sonhos não envelhecem.  Amor, sentimento primoroso da identidade humana desfia-se e nos desafia na busca da melhor forma de viver. Os problemas sobrevivem na pauta dos dias mais comuns. Mudam de cara, de layout, desfilam na fieira de gerações.

E o escrever, linha d’água da vida, moto contínuo. Oportuno: quantas ocasiões fazem o escritor?Quantas aldeias adormecidas a despertar...

Importante diálogo: o real e a  escrita. Suscitam olhares. Ilustram imaginações e se desdobram em reescritas. A inspiração inaugura-se no reflexivo, no burilar, na escolha do tom. Poemas não florescerão da ponta dos dedos.  A exposição: o mural de palavras que guarda imagens. Algo a investir,  surpreender! Se a imagem vale por mil palavras, um olhar apurado vale por um infinito. Com a palavra o olhar vira busca e resgate. Capta as emoções primordiais. O movimento se descongela e se corporifica. Tela, papel a arte realizada. Vale uma crônica? Um poema? Entre linguagens, sem predomínios ou muros, a vistoria do olhar-palavra intensifica o jogo do criar. Uma imagem aponta. Instiga, alimenta, sugere, amplia, convida, propõe, projeta. A crônica evidencia o olhar. O poema acorda em corte de pedras. Há após leituras e escolhas. Mas há o projeto: o texto. Outro suscitar provocativo. Fios de meada pedagógica, acredito.

Esse solitário ofício da escrita. Mostrar costuras, avessos, transparências de tirar o fôlego. Cavernas. Para ser solidário.
Um filme perturbador nos causa incômodos dos mais diversos. No abrir os olhos as palavras que guardam repensar. Talvez dados alarmantes. Ou a borda da história que nos retrata. Atentos para o perigo de generalizar ou achar.( As ONGs são poços de más intenções?)  Das provocações à imprescindível reflexão.  Cenários se desvelam nas palavras: generosidade ou exploração  se formatam para o jogo leitor.  Uma proposta ácida, provocadora pode nos atrair.  Saímos do pés atrás para ficar diante do estarrecido que aflora.  Nosso olhar disponível a descobrir.  A desvelar atitudes, valores ou descaminhos. Aqui é que entra mais um fio do nosso fazer, outra proposta.
Do lado educador aposto em lugares menores, nada alardeantes, estridentes: o imprescindível para que o livro caia em algum redemoinho humano e aconteça de vez. Que aconteça silenciosamente a partir de pequenos pontos disparadores que alarguem sonhos e contemplem desejos. Que as palavras das páginas virem vitrines, cortinas que se abrem para despertar os desvios dos mais curiosos. Outro fio: estratégias das tantas  brincadeiras íntimas com as palavras. O lugar do livro é na casa de cada um: no seu cotidiano,  chuva e sol. Isto e aquilo. No lugar onde a gente é.  No quartinho, na rede, na tenda. No tempo e espaço disponíveis. Sempre. Moram com a gente, como pessoas queridas. Alimento e beleza. Disponíveis ao nosso desejo particular. Não fala por si. É apenas possibilidade generosa. Por ele um enveredar pela fantasia aos sabores de uma voz convidativa e inebriante. Que o livro seja amoroso objeto que nos acompanhe na vida. Que a reinvente, que a revigore.
Mas, lugar de livro morar com necessária certeza é na escola.  Objeto de primeira necessidade, consumível, perecível.  Após  sinfonia de dedos vorazes. pelo saracotear das travessuras leitoras    fica sujeito a se autodestruir. Nela o impulsionar de movimentos leitores: caixote, carriola ou carrinho de supermercado. Que circule, povoe mãos, desperte olhares. Ei-los, os livros,  numa cesta sob as árvores dispostos aos desejos pequenos ou armazenados em lombo de burro, caixeiro-viajante,  a circular pela comunidade escolar à cata de novos leitores, ampliando e criando novos espaços de respiro. Ah, esses inconfundíveis companheiros.! Sobretudo nas salas de aula, lugar nobre e principal! Ali que mora a potencial mediação. Ali vivem os atores das leituras, cúmplices de um projeto tramado em palavras de se aprimorar a cada dia.  E o palco e a ação. Sugeridos, experimentados, escolhidos, acolhidos, partilhados pelo gosto de espera e dos olhares a despertar. A experenciar. Sopros de vida. Com liberdade e alegrias. Sem alardes.
Há muito para falar? Suponho que  alguém que nem tenha ido a alguma Bienal do Livro possa nos dizer sobre esse lugar e sobre o papel de cada um de nós na vida dos livros. Neles, o plural do Universo. E o particular e genuíno.Estações de tantas luzes. Eterna exposição. Quando nele nos adentramos temos o coração num pulsar de solenes expectativas. O farol de muitos e outros detalhes  a saber, a descobrir. Nas breves despedidas saímos aturdidos,  felizes, plenamente acolhidos pela poesia que guarda todos e cada um de nós.
Simples e rasteiro, somos sustentados pelos nossos sonhos. Talvez pela ínfima possibilidade em realizá-los. E assim continuar alimentando a máquina humana de sonhar e viver.
Em  delicada beleza as palavras se instalam. Em melancolias ou alegrias. Mariposas etéreas se debatem na busca de luz, esse tecido magnífico. A poesia das palavras alinhadas gera sons. Provocam ondas a circular pela eternidade mesmo depois de não mais serem ouvidas. A poesia e a eterna ligação com o mundo. Nos leva de volta, nos permanece. E nos leva além. Em aprofundamentos, como as mais divinas forças.O fio do corte.

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Começo esse texto sobre filmes e livros com a questão-título quase óbvia, motivadora às vezes de algumas das nossas conversas. Geralmente consideramos o livro melhor que o filme. Por várias razões: sua ideia original, podemos ser donos do próprio conduzir em nosso particular tempo de leituras, percebemos as sutilezas e os detalhes, usamos de sobra a imaginação, temos dose ampla de criar e sentir uma aura de co-autoria. E por aí vai.

Vou direto ao assunto, sem fugir da intenção. Vi o filme e li o livro. Fiquei por um tempo na dúvida sobre qual seria melhor: o original, a motivação, a inspiração ou o seu produto recriado em 3D, com direito a sentir o sonho mais de perto e em movimento, quase real. Decidi agorinha e me lanço à apreciação de vocês. Livro ou filme. Ou, filme e livro. Tanto faz. O importante é - em palavras ou no mover da sétima arte - nos adentrarmos ao mundo dos sonhos a que temos pleno direito.

A história que se corporifica em ambos é a de Hugo Cabret, menino órfão que vive escondido na central de trem de Paris dos anos 1930. Esgueira - se por passagens secretas, faz pequenos roubos para sobreviver e para consertar seu enigmático autômato. Sem ser percebido, cuida dos gigantescos relógios da estação: escuta seus compassos, observa os enormes ponteiros que dançam meticulosamente, responsabiliza-se pelo funcionamento deles. A sua sobrevivência depende do anonimato. Tenta se manter invisível. Guarda um segredo que é posto em risco quando o severo dono da loja de brinquedos da estação e sua afilhada Isabelle cruzam o seu caminho. Ainda posso dizer de incentivo imaginoso que um desenho enigmático, um caderno valioso, uma chave roubada e uma figura mecânica - herança do pai de Hugo - estão no centro da imprevisível história.

O livro inspirador é  “A Invenção de Hugo Cabret”, de Brian Selznick, publicado pelas Edições SM. Ao folheá-lo já podemos nos imaginar sentado no escuro à espera do início do filme. O livro com mais de 500 páginas, traz muitas ilustrações do autor – muito próximas de um storyboard – além de reproduções fotográficas históricas.

Já em  “A Invenção de Hugo Cabret,” filme de Martin Scorsese baseado no livro, é claro, a trama se dinamiza quando Hugo se encontra com Isabelle. Os dois jovens passam a investigar um mistério sobre o passado que cruzam suas vidas. Aos poucos personagens e tramas gravitam aos nossos olhos e imaginação para nos contar sobre a arte do cinema. Mais que isso: a influência de Georges Méliès sobre ela. 

O longa nos leva a uma sutil aventura do passado cinematográfico, desde a invenção do cinematógrafo pelos Irmãos Lumière em 1895 - que achavam que sua traquinagem teria um interesse técnico passageiro como forma de divulgação da sua fábrica de fotografia - até os longas mais complexos para aquela época.

O filme nos diz brilhantemente que foi preciso outro francês, Georges Méliès, para dar sentido artístico à descoberta dos Lumière. Méliès vislumbrou o bom futuro daquela invenção. Com sua câmera e estúdio construído no fundo de um jardim realizou seus primeiros filmes. Todo seu talento de ilusionista se encaixa na nova técnica. Cenários de papelão e tecido, luz do dia, trajes e cenários mirabolantes, além de colorir as imagens em preto e branco foram especialidades do então mágico Georges. Suas trucagens cinematográficas bebem da literatura: Julio Verne, Grimm, Perrault. Assim é Méliès o primeiro cineasta da história. Produziu e dirigiu cerca de 500 filmes, de 1896 a 1912.  Ele descobriu que o cinema poderia recriar sonhos e mostrá-los ao espectador. Este é aspecto fundamental da trama.

Penso que o cinema é arte de manipular, enganar, iludir. Bom demais. Ele nos envolve em uma história ou situação que num determinado tempo nos é palpável, real, por mais absurda que possa ser. É mesmo poderosa a sétima arte em materializer sonhos, através da manipulação de imagens em movimentos mágicos e ilusionistas.

Integram-se à ficção e em plena harmonia referências a filmes antigos. Testemunhamos em meio ao 3D “A Chegada do Trem à Estação”, um dos primeiros filmes feitos pelos irmãos Lumière que causou pleno frisson na belle époque parisiense. E mais: várias citações de filmes mudos: “Luzes da Cidade”, de Chaplin, a clássica cena de Harold Lloyd pendurado no relógio em Safety Last!  e “Viagem à Lua”, o conhecido filme de Méliès. Quem diria que 116 anos depois da primeira exibição de um trem vindo em direção à plateia, agora inserida numa produção em 3D ainda seria capaz de causar comoção pela ilusão momentânea da imagem em movimento?

Sem querer ser crítico de cinema sinto no meu lado espectador a brilhante direção de Scorsese. A meu ver  ele tece um resgate da figura de Méliès, com toques de um filme pensado para o público infanto-juvenil. Tudo se desamarra de uma seriedade para brincar de fazer arte e cinema. É uma celebração. Temos um Scorsese diferente, outra cor e sabor e que se deixa levar pelo 3D como brinquedo novo. Este filme é indicado para cinéfilos e curiosos de todas as idades. É uma verdadeira aula de cinema!

Concordo com os que dizem que em a “A Invenção de Hugo Cabret” temos talvez a melhor utilização de 3D até agora. Prepare-se para deliciosa viagem!  Scorsese filmou com câmeras 3D ao invés de simplesmente converter o longa.  Usou sabiamente a tecnologia de sobreposição de camadas, proporcionando uma experiência de imersão fantástica. No escurinho do cinema, bem à frente dos famigerados óculos escuros, dançam e pulsam lindamente em nós elementos etéreos: fumaça, vapor, neve ou simplesmente poeira da loja de brinquedos. E por entre as sutilezas de contar a história de Hugo conta a história do cinema. Somos conduzidos pelos olhos de um menino. Realidade e fantasia se mesclam. Somos espectador em sonhos.

Livro e filme realizam testemunho eterno de amor pelo cinema. Uma das frases de Méliès no filme é "Venham e sonhem comigo". Acho que podemos obedecer em ambos os casos. Teremos belos momentos em nossas vidas. Sobretudo os que amam o livro e o cinema e toda a sua arte.
 
Antonio Gil Neto
“Um galo sozinho não tece uma manhã: / ele precisará sempre de outros galos.(...)
“Aquele rio / é espesso  / como o real mais espesso.(...)”


(João Cabral de Melo Neto)

Na tela João Cabral um tanto quanto jovem, risonho. Atrás, como se acabado de escrever na parede, letras de brilho de faca e sanguínea frase que dá títulos, vislumbres. Rabiscos de poeta em possível. Um poema por dia. Tecendo manhãs.
E assim se faz visitas. Virtualmente? Quem sabe de bom grado e de coração confesso. Presente no imaginado, toque de perto em olhar.  Esse nosso estrangeiro olhar...E um cheiro do fantasioso: objetos, cenários de singela vida. Tantos Severinos poetas!  Por hora adentrar-se em  memórias. Outros rios e versos. E lembranças de pedras que nos enobrece de raiz e céu.

Lida de chegar, viveza em desvendar palavras é que se começa e se tece na Educação. Os mistérios do fundo do mar em paralelo ao poço de cheirar cola. Entram de imaginação. Mas meninos, se configuram na consistência poética. Fico apostando, uma vez de muitas,  em pausa avaliativa, em leitura da mais importante na feitura do humano. Tecido em memória e fantasia, esta lente. E o analisar o tempo. E o que decorre. O que vive tantos meninos?  Famílias, escolas, ruas... Poderão ser modificados por encontros transformadores. Que se possa recontar suas vidas como quem conta sobre vidas cidadãs. Sem esconderijos.  Agorinha este refrão mineiro: “os sonhos não envelhecem... ”.

Talvez este texto pudesse dar tantas crônicas! Mas vou deixando-as no revés. E o que me leva aqui e agora é o espaço educador. É tempo de oficinas? O Futuro é gênero que se reinaugura. Crônica ou não, nossos afazeres pedagógicos andarão a acontecer que sei. Desenham em silencioso trabalho,  em sonho e em melhorar esperanças.
Aviões cruzam o céu, quase livres. Feito pássaros emergindo de florestas perdidas.  Depois outros mais. E tudo segue nos cronômetros fatais e regularizados.  Fico mais a olhar as nuvens embelezando o azul,  em eternamente. Poderá esse eterno de nuvens ser prisão?  Embalado em filosófico já olharei todas as caras, os transeuntes e os que estão na minha aldeia. Na minha faina. Sigo as linhas. Imerso em céu de íntimas possibilidades.  E o por fazer. Por eles e por todos. Nós, humanos possíveis, com direito a viver sob as nuvens. E em estações de pequenos sonhos.

Sempre viro e volto para o preciso pensar o depois. Mais as dificuldades a imaginar e a haver. Sinto o  tecido de mais possibilidades em meus quereres. Vejo de longe números em meio aos emaranhados. Um cheiro acinzenta o redor. Há mapas de cicatrizes indicando percursos. E a volta? Mas aviões continuam suas procissões no azul. As nuvens, eternamente livres. Os meninos, bagagens. Quem sabe não se veja no desenho plúmbeo um vislumbre de alguma cor. Você tem e quer?

(Guardar uma ideia em página de almanaque como quem guarda flores. E um norte em vermelho. Ah, e um trecho de uma canção!)

No lado da prateada liberdade imenso muro alto. Alto sim, com mil aparatos técnicos de segurança.  Ali uma árvore se empina livre, entregue à correnteza do verdor cósmico em estações. Gerara flores para a vida correndo solta. Um vento brando derrubara algumas já vingadas. À curta distância um leito de flores brancas amaina o chão. Generosa cumplicidade. Em algum canto da cidade alguém leria alguma notícia e  em outro, um pavonear de adereços, gesto curto e certeiro. Mas, haveriam olhos no reinventado. Cúmplices em fantasias. Sede e fome impulsionando outros movimentos e corpos. Em desenho e dança. Para as próximas os provisórios olhos sagazes. Peixes de luz, se inebriarão dos pequeno delitos amorosos. Ou se traquinarão na mais marota das experiências.

Fecho a porta, duas voltas. E a janela plena para o ar leve da manhã em sintonia com o que sinto ser importante. Dizer deste tema. Lançar ideias que aludem o fazer nas escolas. Não me arrisco a novidades. Às vezes as obviedades e o aparente têm sua importância a olhos navegantes.

Peso um tempo de averiguar tessituras. Ação e esperas. A construção. Nova folha desponta frágil e tenra em campo de árvores altas e fecundas. E em poesia. Sujeitas à intempéries, riscos, agudezas. Mas sabem da quentura, da chuva e do alimento em raiz. Vão reescrevendo-se na composição de ocupar lugar ao sol. Sem luta de forças, queda de braços ou o que separa fracos de fortes. É a arena das possibilidades em palavras. Agulhas em trabalhos que vingam. Fachos, pequenas luzes, gravitando-se. E o luzeiro na imensa escuridão.

Um cheiro de café se espaça pelo ar. Uma nesga de sol desenha no chão da sala o brilho desse dia. A fumacinha da xícara sobe num compasso indolente e as flores alegres no vaso são apenas moldura para a música tomando conta de um breve viver matutino que se foi e se prende nas palavras. E no eterno verde. O piano de Tom e a voz única de Elis tomam conta de tudo.

Paro por aqui. Mas, quero lhe dizer em ligeira esperança palavras que lhe instiguem. Vislumbro sua próxima festa e algum surpresar na sua visita à poesia. E agora só boas portas e janelas abertas. Vamos brindar pelo novo dia.
 
Antonio Gil Neto
"Tanto tempo, juntos!/ Tanto... / Tantos dias nesse vagão./ O trem da vida passando / Horas, dias, vidas, / Sentimentos, /Vivemos em cada estação.”
Transformar a dor e a saudade, que toma raízes, em guardador de memórias. Deixar que circule o leve brilho do que se foi, de quem se vai, este incógnito. Entendam, compreendam e sintam. Abram espaço para reconhecer rasgos de presença.
Temos às mãos o mais sublime e sagrado criado: as palavras. Assim se pode homenagear o que fica em sonhos. Escolher palavras nascidas de pulsar presente. Assim, os céus das memórias. Toldo azul e branco. E as estrelas de eterno luzir.
No meio das vozes, dos anunciados, a ponderação. E o recente. Mais o impossível.
Leio de interessantíssimas razões. As matérias e os enredos. Interlúdios. Teoremas. Aguço-me por tantas pistas de descobrir. Brilham. Nuda Veritas. Reverberam. Revisito suas palavras em mãos, ouvidos e plena disposição. E com olhar do mais curioso. Alvoroçado com o tecido das sua cores e tons, abstraio-me. As mensagens circulam. Disparam viagens.
Sempre uma história recolhida. E tantas a revelar. Há paixão pelo ler e escrever? Fisgado por inquieta aparição e instigado ao encantamento vou me reinventando que só. Sabedor das histórias tão bonitas renasço abruptamente. Motes e fantasia. Um cenário dessa paixão em palavras de Drummond: “E eu não sabia que minha história/era mais bonita que a de Robinson Crusoé”. Muitos mais haveria. Quem sabe num outro dia, noutro livresco passeio.
Mergulhar para aqui recontar, reencontrar. E revelar o imprescindível por nos tornarmos letrados. Nos encantarmos pelo pitoresco daquilo que brilha e pulsa na palavra que nos agrega em humano. Quem sabe não se possa recontar episódios renascidos! Um jogo generoso de descobertas...Mergulhar. Fundo. De viés e de peito em chamas. No tempo, na memória da imaginação. Nas palavras, este imprescindível. Feito faca, feito flecha, feito fogo.
E assim foi e assim é. Queremos continuar nos lispectorizando, nos pradiando, nos drummondiando, nos quintaniando, nos pessoando, nos machadiando...Virando gente em letras. Sermos pluralmente únicos. Em pulsar no que nos faz ser. Cúmplices das próprias artimanhas. Das armadilhas destes lindos labirintos.
Lugar sagrado como este: morar breve no miolo de um livro. Ou ser luz de desejos em telas virtuais.
Nossa alma se revela em letras, entoam olhares de corações leitores. Nos aventuramos e isto nos leva a aventurar-se montão. Aos poucos. Toque sutil de espreitas e prosseguimentos. Mas, sempre à espreita, a primeira vez. Dentre mil belezas um céu a ser devorado aos poucos. Manso quase e de soslaios. Um não saber em véus. Poderíamos contar o que me ouve em silêncio em clarão de sabedorias? Incendiarmo-nos em todas as veredas, desertos, montanhas e esboços. E nas salas de aula por onde passar a incondicional paixão pela palavra escrita.
Do lado de cá suscito algumas alegrias de leitor. Fecho e abertura, trecho de poema, canção. E ensejo cada palavra subir ao coreto e se inaugurar. Alvissareiro, em primeira mão continuarei aqui. E o que inaugurado: livre, poético, pedagógico? O que nasce em palavras pode ser entregue. E brotará em novo.
Movimento profissional, experiência iluminada, um modo, uma cor, um algo mais, um sem fim que nos remeterá a uma janela? Nossas palavras, com que dialogamos. O que nos diferencia e nos une. Lanço-me nesse fazer de encantamentos. Pequenas bonitezas para viver a vida e para sustentar nossa profissão, já que há o possível. E esta esperança. Faremos isso como quem abraça o mais forte. De sonhos comuns. E os que podem com a garra e o feitio. E depois, o puro sentimento. Só imaginar e imaginar. Que imaginação sozinha não daria conta de episódio singular ou importante. Precisa ser apontada, como coletar encontros, conversar miudinho com toda gente que se põe leitor, esta peripécia que ainda resplandece.
Penso é no educar da leitura com a escrita em íntima trama. Em qualquer destino. Temos por este legado o perene que semeia e lança o futuro a despontar.


 
Antonio Gil Neto
“ (...) O amor que não esqueço é justamente o que não sei os motivos de seu fim./O amor que permanece é aquele que não sei como começou”. (Carpinejar)
“Tudo havia começado com pungente ideia.  Diante da mesa, do trabalho, da janela pleno repertório de escolhas”.
Sempre polêmica a imagem do educador desses nossos tempos. Em nosso percurso uma arena encimada e circundada por ela. Uma profusão de palavras em colagem de almanaque à disposição de boas estratégias educadoras. É possível ler Machado a qualquer hora, em qualquer lugar, para qualquer um, com atenção, emoção e prazer? Imagine só as vibrações leitoras! Delyrio?
Matrizes para um movimento: a origem de uma cronologia sumária incrustada nas paredes, penduradas no teto, mesas e cadeiras feito pesquisa e exposição. Explodirá aos olhos educantes, visitantes em danças pela alma do perfeito escritor. Desata-se assim um tanto de enigmas. Esses visitantes, de olhos simples de quase leitor, podem pegar um livro, sentar-se numa poltrona e manuseá-lo. Livres. Sentir- lhe os odores, marcas de tempos. À vontade, ele se mostra ao sol. Vale brincadeira, passeio provocativo e imaginativo em boas intenções. Do que continuarão as palavras que lhes permitiram resgatar alguma celebração? Por elas um caminhar em jeitos de aventurar-se...
E aquela façanha da falta de assunto? Cadê o tema para escrever? O desencontro a que estamos sujeitos a viver. Imerso em pensamentos se recupera de baque inicial. Uma palavra, quase gesto, pode mudar tudo. Bem posta, de incrustação firme se instala no lugar da alegria a relampejar.
“Viajo, viajarei em esperanças. Recupero desejo perdido, menino curioso frente ao quase desconhecido brinquedo. Em breve felicidade clandestina investigo o que estava guardado dentro do abrupto”.
Em capa quase vermelha, o texto, a planta. Alvo e finalidade. Um jeito de reencontrar o sempre perdido pode ser saltear as páginas com um chá de gengibre. À mercê de algum tema algum desses  movimentos morarão em casa. O tempo passa em sinfonia regular. A orquestra ecoa na vida e o baile muda. Meninos viram homens, arrumam suas vidas como podem. Personagens de tempo. O agora vai mudando de novo e retoma. Mais rápido que uma lembrança ou um pé-de-vento provisório. O que era claro está tranquilo, límpido, outonal?  Tramas. Novos dias. O hoje desse futuro interminável acontecerá como benção. E haverá memória de sentimento vívido. Desenhos de cor.
Os que passam permanecerão. Extasiados, revigorados em atmosfera de velho jardim amanhecendo plenamente. Que exala incomum, inebria daqueles olhares. E havia tantas flores! Do rosa ao carmim! Um momento de paraíso naquele lugar daria outros.
Ah, as palavras. Cada vez que elas surgem surgirão festejos de imaginar.  Um detalhe aqui, uma surpresa: acolá. Para  recriar a existência e acalantar o nosso bel-prazer. Infringindo miras e o eficiente de sentido. Ótica de transgredir assim. Para isso , jeito de pés desnudos, aventureiros de caminhadas, mesmo experimentadas. Por eles desbravamos chãos. Ora espinho, caco de vidro, um escorpião que crava sem piedade esses destemidos aparatos de busca. Pés, metáfora de buscar. Ferem e sangram. Há pedrinhas, deslizes. Saltitamos. Nossos pés bailarinos fogem da dor. Querem água fresquinha acarinhando. Imenso frescor. Sob tenda de céu curioso minúsculos lambaris borboletearão por entre esses temerários andarilhos e darão sinal de prosseguir. Rumos. O certo está por vir.
E há sempre um viés de memória dos mais. Sem rever o que é em preto e em branco. Projeta-se em espontâneos coloridos. De sabor se aquarelando. De lembranças guardando o invisível. Assim o reviver em palavras.
Esses são segredos e lições dentro das coisas. Narrador e leitor de pés trilhados. De mãos dadas com seu percurso. Páginas viventes.
Toca fundo o sentimento dos que lidam com Educação. Singelo, deixam marcas de vida e de história indeléveis. Somos textos, estados permanentes em criação. Somos reescrita e aprimoramento. Por isso o aperfeiçoar e esses novos rumos.  Guardamos o que vivemos. Somos uma biblioteca que sangra. Plenamente possível e inesperada. Nossos desejos íntimos dialogam com limites, vigoram memórias já sabidas de intensas atribulações. O aprendido mais o nebuloso, combinatória indescritível a nosso favor: um encantamento e quem sabe o leve desabrochar de sonho.
“O  que guardam estes exercícios? Outras tarefas do quase indecifrável. A decifrar”.


 
2904_gil_gdeUMA INTRODUÇÃO MERECIDA
De repente, o Tempo. Me dei conta de que havia escrito mais de 100 textos. Não seria motivo para comemorar? Seria sim. Uma roseira que floresce plena? Algo do tipo de milésimo gol de Pelé? Um alfabeto que procria? Soube claro de alegria. De importância íntima e valorosa. Isso sei.
O que fiz? Dos textos postados mais: mil ideias... Inspirei-me em mim mesmo. Melhor: em nossos diálogos miúdos e pungentes, tão potentes em pedagogia e poesia. Desde 2007 bordando as primeiras palavras nesse gigantescamente virtual... Fui rememorando os textos, eles que são os encontros. Deles uma ideia, uma frase, um fragmento. O memorial. De novo arranjo, fui tecendo textos de novo feitio. Por trás, nossa história na Comunidade Virtual.
Com intento de agradecimento, brinco em cândido patrimônio: nossas palavras. Brindo a elas com vocês. E aos nossos futuros encantamentos.
Como aventureiro de boas paragens revisito palavras semeadas na tela da nossa Comunidade. Fui relendo, me repaginando. Novas surpresas. As lembranças. Passagens, trechos, brechas... Por elas me reencontrei. Reencantado em fogos comemorativos fui abraçando algumas delas. Respirei-as em hálito inventivo. E as trouxe para este presente. Virariam textos renovados. Linha dágua de tantos olhares leitores. Resultados: alguns textos renascidos dos mais de cem já postados. No milagre das palavras que bailam entrego uma temporada comemorativa: estes INÉDITOS INEXATOS.
(Voltei o filme, lembrei-me dos primórdios. Lelê, Helô, Roselene: encorajadoras valentes. Agora, do “pessoal todo”: Regina, Bianca, Jéssica, Nat, Luiz, que tecem amorosamente este nosso convívio com palavras de bem comum).
Boas leituras!
Revivam os cem textos em mais. Com um jeito de permanecer agradecido por haver a presença de cada um de vocês. Passam, namoram de leitor e deixam a indelével marca educadora.
Gil.
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1.    UM MENINO QUE ESCREVERIA MAIS DE CEM TEXTOS.
Antonio Gil Neto
“Eu vivo sob um poder/que às vezes está no sonho,/ no som de certas palavras agrupadas,/ em coisas que dentro de mim / refulgem como ouro:” (Adélia Prado)
(Teria encontro de encantamentos. E escreveu mais de 100 deles. Num toldo de realidades e fantasias os textos se teciam em cenário iluminado por palavras. E haveria 101, 1001 tramas. Esse infinito a escrever...)
Menino de interior não haveria de nascer para inaugurar letras em papel. As palavras foram se achegando, aconchegando-se vento bom, promessa de alegria pródiga. Aos poucos farturou-se de vida que multiplicaria pontes. Em milagre de engenho: as palavras. Semeariam mundos novos. Possíveis de esperança. De ofício.
“Às vezes me ponho a lembrar, a sonhar acordado no metrô, nas viagens de ônibus, nos intermezzos das leituras, no olhar à toa pela janela em tardes com chuva querendo vir...”
O Tempo, os tempos. Com seus preciosos parênteses no infinito surpreende em encontros. Revigora minúcias do passado, não se sabe de mais íntimo. Aderentes e ardentes, as verdades intactas. As memórias, de escondido tesouro.
Poderia ser tradutor das brechas onde brilham fantasias. Tramas para saber. Poderia ser indicador de sonhos e descobertas. Pontos de luz, arco-íris e pão. Um encorajador, um silêncio do futuro que se faz a cada pedaço e alento. A cada gesto e olhar. Poderia ser um amante das esperanças, de amanhãs, dos desejos mais sutis. Mas, camaleão moderno, se esquiva e se inteira em gramáticas do criar.
“Uma espécie de atordoamento me faz repensar estas coisas que aqui digo, aberto ao tempo e ao espaço. Vou buscando as lentes para me aliviar.”
Descobriu maneira simples e pessoal: decifrar, experimentar as múltiplas de palavras. Esses objetos brincantes que brilham possibilidades. E agora, as suas palavras: quais reluzem no agora? Quais lhe dão lampejos? Que outras se quer para este tempo, léguas de distante quase esquecido?
Eis as palavras, vivas de arfar. As inesperadas, as que estão à espreita, as que saltam da memória para enfeitar. E esse falar de infâncias? Conte, nem que for um pedacinho! Gostou? Você agora é seu personagem de convívio com as raízes. Quais palavras lhe veste em bordados do tempo? Que fascínios guarda em pedras coloridas?
Sempre sobra um acalanto para o inesperado. O inesperado é da bagagem do educador que somos. Nestas trilhas, nosso coração é inquieto de saber mais.
Desenha deslumbramentos, diz do fazer, da lida com palavras. E gentes. E o desfiar em poesias, novas manhãs, cantares. Abrir as janelas, arquitetar alicerces para sonhos. Mais o mistério do que é homem. A vislumbrar, a criar. Existências se escrevem, as próprias vidas. E, pois, a palavra escrita. Projetada. Para fora de grito lépido silencia: íntimo pensar que se corporifica em outros. Redigir: desfigurar palavras? Para isso as páginas, os capítulos, as telas iluminando-se a toques múltiplos. Poder de encantamentos entre.
Por conta de ingênua curiosidade, inventei histórias  que nasciam não das letras indecifráveis, mas dos desenhos que as enfeitavam. Agora trago as palavras, histórias vivas da memória de cada um que há.”
O exercício da curiosidade: nítido aprender. E a extrema importância: abrir o livro, a decifrar. Fazê-lo existir. Eis a explosão que cumpre em destino. Na leitura, a fagulha do existir. Os diálogos pairam no ar, sem mistérios, nuvens convidativas. E o inefável pousa em campo de delicadas cores. As descobertas: breve milagre.
Os textos se alinhavam em generosidades. Num lugar imaginado e inimaginável o Inesperado por se deslumbrar. Essas palavras forjadas iluminarão rincões de mar e sol. Paragens. E tantas rosas-dos-ventos. Vereda dos que amam a língua portuguesa.
Uma perguntas ribomba: que lugar é esse onde escolhemos permanecer? Ponto de espera,  nascente, minas e olhos d’água fecundando a travessia de fios aos ventos? Afetos que geram trapézios com rede que acolhem abraços almejados e tramados às margens da alegria? Ficam rastros e a pele do futuro. Um veio amoroso, à espreita das correntezas e das querências, modificando a imensidão do campo de sonhos. À terceira margem estarão alertas, pulsantes. Eis palavras por encantar.
No inventário sobre a mesa, na tela, o vasculhar da espera e do inesperado. Um sol de inverno convidando para algo mais. Abrir frestas ao novo, acolher começos e louvar mudanças. Aventurar-se em trabalho poético. Aventurar esse espaço, o virtual que carrega as artimanhas do mundo: as páginas dos livros. Perambular. Viajar por algo novo escondido em minha bagagem. Sustentador, levar poemas e estabelecer pontes ao fazer de poesia. Plenamente conectados: trabalho e credo, se entrasse em cidade de poemas. Um espanto bom. Um livre e inteiro dispor.
“Por quantas luas fico em tempo de brincadeira feliz? Pensei alto. Educador que se preze, acredita. Tu és como o tom que musica. Perceberão o verbo musicar? Imagine o que pode gerar isto naquele começo...”
Lá fora o céu se avermelha. E tudo recomeça. Jogo destinado a espectadores viventes, anônimos que perdem em barcos, em viagem. Orgulhosos atores de singelas representações. O que foi narrado em Javé guardo agorinha: “Uma coisa é coisa acontecida. Outra é coisa escrita. O escrito melhora o acontecido.” Biá nos fala das palavras do escritor amalgamando a realidade em ficção.
Nas entrelinhas, significância e beleza. Mais ainda. Tentamos salvar o que somos frente ao que nos é valoroso.
 
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htCaros colegas encontrei esse site muito útil, vale a pena conferir" tp s://adonisdutra.com.br/simulados-de-portugues-7ano/